Moda com identidade nacional?

Por Amanda Prado

Dizem que o Brasil está na moda. E está mesmo, é a economia fervilhando, grandes festivais de música, Copa do Mundo, Olimpíadas, e por aí vai. Os olhos dos gringos se voltaram para o país, e nós batemos no peito para confirmar isso com a ajuda de um discurso nacionalista desesperado, tentando conferir algum sentido nessa (i)realidade, tentando nos orgulhar minimamente de sermos brasileiros.

A cantora Katy Perry literalmente vestindo o Brasil no Rock In Rio de 2011. E você, tem coragem?

Mas que Brasil é esse, o qual nós compramos e vendemos? Quanta brasilidade existe de fato na figura de uma arara? Quantos brasileiros já estiveram na Amazônia? O samba continua sendo o ritmo da nação?

O Brasil está na moda, mas o que a moda diz sobre o Brasil? Vejamos algumas considerações sobre o tema:

Identidade Nacional Brasileira

É recorrente tratar de identidade nacional encobrindo “conflitos raciais”, trocando “raça” por cultura. Mas o fato é que se salientarmos apenas uma das três matrizes que deram origem ao Brasil (tupis, negros e europeus), não estaremos falando de Identidade nacional.

É possível dizer que essa questão da identidade brasileira provocou -e provoca- discussões. Afinal, qual o principal elemento que nos diferencia dos outros povos, mas ao mesmo tempo unifica a nossa cultura? Se é que esse elemento existe, o que define a nossa brasilidade?

Isso não quer dizer que a identidade nacional brasileira não exista, como esclarece Darcy Ribeiro em um depoimento sobre a temática, há poucas coisas mais sólidas do que a identidade de um povo, pois quando um pai cria seus filhos, faz com que eles convivam em uma cultura, sendo moldados segundo ela, fazendo com que os indivíduos dessa cultura se apoiem em suas identidades convictas, sendo que essa convicção absoluta é a responsável por fazer de um indivíduo membro de uma cultura ou povo.

Porém, antes de tratar da identidade brasileira propriamente dita, é necessário refletir sobre a identidade, conceito amplo, que deve ser especificado sobre qual prisma será analisado.

Identidades são construções sociais formuladas a partir de diferenças reais ou arquitetadas que operam como sinais que conferem uma marca de distinção. Ou seja, a identidade é sempre manipulada, mutável e variável quanto aos diferentes níveis de influência que sofre, fugindo do campo “natural” – (SANT’ANNA, 2007)

Para Ortiz (1985), a identidade constitui-se numa das principais mediações entre o indivíduo e a estrutura social por sintetizar os aspectos psicológicos e sociais que permite dizer quem é o indivíduo e qual sociedade é a que ele vive.

Quanto à identidade nacional, Ortiz a caracteriza como uma entidade também abstrata, não podendo ser alcançada totalmente em sua essência, sendo exposta de acordo com o que é vinculado às formas sociais que a sustentam.

Segundo SANT’ANNA (2007), não há uma identidade nacional que possa ser o elemento identificador e compositor da unidade de toda uma população.

As identidades, como propriedades distintivas que diferenciam e especificam grupos sociais, precisam ser moldadas a partir de vivências cotidianas, e as sociedades possuem níveis de estratificação que impossibilitam uma total e completa representação de um povo.

Nesse sentido, no Brasil tradicionalmente se procurou definir a identidade nacional, caracterizando o brasileiro como produto do cruzamento de três culturas distintas – a branca, a negra e a indígena – sendo que tal miscigenação definiria, mais que identificações físicas, mas também as características comportamentais do povo brasileiro: a alegria, a cordialidade, a malandragem, entre outras.

Embora essas “categorias” não sejam mais totalmente aceitas, ou ainda que sejam contestadas, tais adjetivos frequentemente se prestam à definição dos aspectos identitários do povo brasileiro, inclusive quando aplicados na mídia internacional, que coloca o Brasil em foco salientando-o como destino turístico exótico.

Porém, alguns outros estigmas como o folclore, as riquezas naturais, o futebol, o samba, a sensualidade e o carnaval são enraizados por nós mesmos em nossa cultura como a nossa identidade nacional, o que se reflete em diversos aspectos, inclusive na produção de moda.

O próximo post  tratará justamente sobre essa moda, com uma identidade supostamente nacional.

Nem tudo são flores (ou frutas) para definir a identidade da moda brasileira- Saias da Stella McCarteney e Prada seguindo a tendência tropical, sem nenhuma referência ao Brasil. E a pergunta é: onde está a brasilidade?

Para saber mais:

  • SANT’ANNA, Mara Rúbia. Império – uma civilização nos trópicos. In: Brasil por suas aparências – volume 2. Florianópolis: UDESC, 2008. [Cdrom].
  • ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 1992.
Amanda Prado

Amanda Prado

Vinte e um anos, mineira, viveu no interior do Rio de Janeiro desde sempre até que a partir de 2011 se aventurou a morar em terras paranaenses para estudar Moda na Universidade Estadual de Maringá (UEM), mais especificamente em Cianorte, onde concluiu o curso de Moda em 2015, e não satisfeita, aproveitou a deixa e se formou em 2013 como técnica em vestuário pelo SENAI. Apaixonada por pesquisas acadêmicas, moda e áreas afins, mas acima de tudo consciente da necessidade da fomentação do campo de saber da moda.

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Por Amanda Prado

Dizem que o Brasil está na moda. E está mesmo, é a economia fervilhando, grandes festivais de música, Copa do Mundo, Olimpíadas, e por aí vai. Os olhos dos gringos se voltaram para o país, e nós batemos no peito para confirmar isso com a ajuda de um discurso nacionalista desesperado, tentando conferir algum sentido nessa (i)realidade, tentando nos orgulhar minimamente de sermos brasileiros.

A cantora Katy Perry literalmente vestindo o Brasil no Rock In Rio de 2011. E você, tem coragem?

Mas que Brasil é esse, o qual nós compramos e vendemos? Quanta brasilidade existe de fato na figura de uma arara? Quantos brasileiros já estiveram na Amazônia? O samba continua sendo o ritmo da nação?

O Brasil está na moda, mas o que a moda diz sobre o Brasil? Vejamos algumas considerações sobre o tema:

Identidade Nacional Brasileira

É recorrente tratar de identidade nacional encobrindo “conflitos raciais”, trocando “raça” por cultura. Mas o fato é que se salientarmos apenas uma das três matrizes que deram origem ao Brasil (tupis, negros e europeus), não estaremos falando de Identidade nacional.

É possível dizer que essa questão da identidade brasileira provocou -e provoca- discussões. Afinal, qual o principal elemento que nos diferencia dos outros povos, mas ao mesmo tempo unifica a nossa cultura? Se é que esse elemento existe, o que define a nossa brasilidade?

Isso não quer dizer que a identidade nacional brasileira não exista, como esclarece Darcy Ribeiro em um depoimento sobre a temática, há poucas coisas mais sólidas do que a identidade de um povo, pois quando um pai cria seus filhos, faz com que eles convivam em uma cultura, sendo moldados segundo ela, fazendo com que os indivíduos dessa cultura se apoiem em suas identidades convictas, sendo que essa convicção absoluta é a responsável por fazer de um indivíduo membro de uma cultura ou povo.

Porém, antes de tratar da identidade brasileira propriamente dita, é necessário refletir sobre a identidade, conceito amplo, que deve ser especificado sobre qual prisma será analisado.

Identidades são construções sociais formuladas a partir de diferenças reais ou arquitetadas que operam como sinais que conferem uma marca de distinção. Ou seja, a identidade é sempre manipulada, mutável e variável quanto aos diferentes níveis de influência que sofre, fugindo do campo “natural” – (SANT’ANNA, 2007)

Para Ortiz (1985), a identidade constitui-se numa das principais mediações entre o indivíduo e a estrutura social por sintetizar os aspectos psicológicos e sociais que permite dizer quem é o indivíduo e qual sociedade é a que ele vive.

Quanto à identidade nacional, Ortiz a caracteriza como uma entidade também abstrata, não podendo ser alcançada totalmente em sua essência, sendo exposta de acordo com o que é vinculado às formas sociais que a sustentam.

Segundo SANT’ANNA (2007), não há uma identidade nacional que possa ser o elemento identificador e compositor da unidade de toda uma população.

As identidades, como propriedades distintivas que diferenciam e especificam grupos sociais, precisam ser moldadas a partir de vivências cotidianas, e as sociedades possuem níveis de estratificação que impossibilitam uma total e completa representação de um povo.

Nesse sentido, no Brasil tradicionalmente se procurou definir a identidade nacional, caracterizando o brasileiro como produto do cruzamento de três culturas distintas – a branca, a negra e a indígena – sendo que tal miscigenação definiria, mais que identificações físicas, mas também as características comportamentais do povo brasileiro: a alegria, a cordialidade, a malandragem, entre outras.

Embora essas “categorias” não sejam mais totalmente aceitas, ou ainda que sejam contestadas, tais adjetivos frequentemente se prestam à definição dos aspectos identitários do povo brasileiro, inclusive quando aplicados na mídia internacional, que coloca o Brasil em foco salientando-o como destino turístico exótico.

Porém, alguns outros estigmas como o folclore, as riquezas naturais, o futebol, o samba, a sensualidade e o carnaval são enraizados por nós mesmos em nossa cultura como a nossa identidade nacional, o que se reflete em diversos aspectos, inclusive na produção de moda.

O próximo post  tratará justamente sobre essa moda, com uma identidade supostamente nacional.

Nem tudo são flores (ou frutas) para definir a identidade da moda brasileira- Saias da Stella McCarteney e Prada seguindo a tendência tropical, sem nenhuma referência ao Brasil. E a pergunta é: onde está a brasilidade?

Para saber mais:

  • SANT’ANNA, Mara Rúbia. Império – uma civilização nos trópicos. In: Brasil por suas aparências – volume 2. Florianópolis: UDESC, 2008. [Cdrom].
  • ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: Brasiliense, 1992.
Amanda Prado

Amanda Prado

Vinte e um anos, mineira, viveu no interior do Rio de Janeiro desde sempre até que a partir de 2011 se aventurou a morar em terras paranaenses para estudar Moda na Universidade Estadual de Maringá (UEM), mais especificamente em Cianorte, onde concluiu o curso de Moda em 2015, e não satisfeita, aproveitou a deixa e se formou em 2013 como técnica em vestuário pelo SENAI. Apaixonada por pesquisas acadêmicas, moda e áreas afins, mas acima de tudo consciente da necessidade da fomentação do campo de saber da moda.

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