A mente perigosa de um artista

Por Diego Silvério

Estava eu, em uma exposição de artes em Joinville, quando me deparei com uma instalação. Era uma escada, com mais ou menos 2,5m de altura, e sob ela uma “piscina” de bolas, contidas em um cubo da mesma altura. Essas bolas tinham cerca de 40cm de diâmetro e estavam cheias de ar. No topo da escada, estava escrito algo como “pule, por sua conta e risco”.

Me deparei com a mensagem e, num momento súbito de coragem e confiança, pulei.

Foi aí que eu descobri que o artista não pensou seriamente nos atributos de segurança da instalação. Ao cair no chão, meio atordoado e dolorido, percebi que as bolas tinham “saído” da frente e não amorteceram corretamente a minha queda. Que engano. Confesso que no primeiro instante em que me deparei com a mensagem, acreditei no profissionalismo e no mínimo de respeito com o espectador. Acreditei que o mínimo de respeito incluiria um olhar mais cuidadoso sobre os aspectos de segurança.

No final das contas, ganhei um belo machucado no cotovelo. :/

A questão aqui foi que, apesar da boa intenção do artista, não houve uma análise mais profunda (ou análise nenhuma) sobre os fatores que envolviam a obra além da história que o artista queria contar. Podemos até pensar que ele não teria conhecimento suficiente para levantar todos os fatores, como a segurança da obra, porém as consequências poderiam ter sido piores e os envolvidos seriamente penalizados (espaço cultural, artista, curador, secretaria da cultura, prefeitura…). Será que ninguém percebeu o risco?

Neste momento, a multidisciplinaridade se torna uma ferramenta poderosa para que um número máximo de fatores sejam considerados. Engenheiros, marketeiros e advogados poderão falar com real propriedade sobre questões de segurança, processos, mercado e legais por exemplo. Esta discussão multidisciplinar pode ser antecipada, evitando assim problemas futuros e prevendo demandas dentro do projeto. Dentro do PMbok (http://www.pmi.org/), as etapas que antecedem a definição do escopo são fundamentais para isso. Na construção do plano de projeto consta a consulta a especialistas para o levantamento dos dados, e é nesse momento em que as questões pertinentes ao projeto são levantadas e depois são transformadas no plano de escopo. Depois da construção deste documento, é importante que todos os especialistas envolvidos no processo façam uma revisão. Não dá pra começar um projeto sem que isso seja amplamente discutido.

Muito mais do que os riscos de segurança ou de experiência de uso, a antecipação de detalhes do projeto junto com os especialistas visa identificar também oportunidades. Essas oportunidades podem ir além da inovação e atingir outros pilares do projeto, como custo e cronograma, afinal, o design também pode ajudar a reduzir custo no projeto e também no processo.

De fato, acredito que não podemos nos dar ao luxo de priorizar a estética e esquecer de coisas primordiais, e acredito que dentro do design isso seja fundamental. Aprendi também que exposições de artes podem ser perigosas.

Diego Silvério

Diego Silvério

Formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), vencedor de prêmios nacionais e internacionais e já desenvolveu projetos para a Intelbrás, Linde, Tigre, Nokia e HSBC. Hoje é designer da Whirlpool e se aventura dentro das áreas de negócios, estratégia e economia.

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Por Diego Silvério

Estava eu, em uma exposição de artes em Joinville, quando me deparei com uma instalação. Era uma escada, com mais ou menos 2,5m de altura, e sob ela uma “piscina” de bolas, contidas em um cubo da mesma altura. Essas bolas tinham cerca de 40cm de diâmetro e estavam cheias de ar. No topo da escada, estava escrito algo como “pule, por sua conta e risco”.

Me deparei com a mensagem e, num momento súbito de coragem e confiança, pulei.

Foi aí que eu descobri que o artista não pensou seriamente nos atributos de segurança da instalação. Ao cair no chão, meio atordoado e dolorido, percebi que as bolas tinham “saído” da frente e não amorteceram corretamente a minha queda. Que engano. Confesso que no primeiro instante em que me deparei com a mensagem, acreditei no profissionalismo e no mínimo de respeito com o espectador. Acreditei que o mínimo de respeito incluiria um olhar mais cuidadoso sobre os aspectos de segurança.

No final das contas, ganhei um belo machucado no cotovelo. :/

A questão aqui foi que, apesar da boa intenção do artista, não houve uma análise mais profunda (ou análise nenhuma) sobre os fatores que envolviam a obra além da história que o artista queria contar. Podemos até pensar que ele não teria conhecimento suficiente para levantar todos os fatores, como a segurança da obra, porém as consequências poderiam ter sido piores e os envolvidos seriamente penalizados (espaço cultural, artista, curador, secretaria da cultura, prefeitura…). Será que ninguém percebeu o risco?

Neste momento, a multidisciplinaridade se torna uma ferramenta poderosa para que um número máximo de fatores sejam considerados. Engenheiros, marketeiros e advogados poderão falar com real propriedade sobre questões de segurança, processos, mercado e legais por exemplo. Esta discussão multidisciplinar pode ser antecipada, evitando assim problemas futuros e prevendo demandas dentro do projeto. Dentro do PMbok (http://www.pmi.org/), as etapas que antecedem a definição do escopo são fundamentais para isso. Na construção do plano de projeto consta a consulta a especialistas para o levantamento dos dados, e é nesse momento em que as questões pertinentes ao projeto são levantadas e depois são transformadas no plano de escopo. Depois da construção deste documento, é importante que todos os especialistas envolvidos no processo façam uma revisão. Não dá pra começar um projeto sem que isso seja amplamente discutido.

Muito mais do que os riscos de segurança ou de experiência de uso, a antecipação de detalhes do projeto junto com os especialistas visa identificar também oportunidades. Essas oportunidades podem ir além da inovação e atingir outros pilares do projeto, como custo e cronograma, afinal, o design também pode ajudar a reduzir custo no projeto e também no processo.

De fato, acredito que não podemos nos dar ao luxo de priorizar a estética e esquecer de coisas primordiais, e acredito que dentro do design isso seja fundamental. Aprendi também que exposições de artes podem ser perigosas.

Diego Silvério

Diego Silvério

Formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), vencedor de prêmios nacionais e internacionais e já desenvolveu projetos para a Intelbrás, Linde, Tigre, Nokia e HSBC. Hoje é designer da Whirlpool e se aventura dentro das áreas de negócios, estratégia e economia.

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