Consumo, Logo Existo

Por Amanda Prado

Eis-me aqui novamente deturpando as mais famosas citações de terceiros para colocar em foco alguns aspectos sobre moda. Então Descartes que me perdoe, mas a sentença colocada como título desse post ilustra perfeitamente o quadro atual de como os sujeitos se utilizam do consumo para formar suas identidades.

Proponho-me então a discorrer sobre possíveis relações entre o consumo de moda e a formação e reformulação da identidade dos indivíduos como processo. São apontamentos dolorosos para alguns (aqueles que se julgam originais), e boas novas para outros (aqueles que andam em bandos), afinal, o que é a identidade se não o eu X social?

A identidade e a Moda

Com o propósito de definir as pessoas como únicas, mas ao mesmo tempo representantes de papéis sociais, o conceito de identidade funciona de forma geral como o conjunto de traços, imagens e sentimentos que o indivíduo reconhece como fazendo parte dele próprio. Porém, a identidade é um processo mutável, o qual tende a se cristalizar com o tempo, mas que sempre está sujeito a mudanças.

No contexto atual, a identidade em seu caráter mais distintivo, quando age de fato com o seu potencial de diferenciação dos demais, torna as pessoas especiais. E se hoje a moda foge da distinção de classes, ela é um dos fatores utilizados para essa suposta particularização dos indivíduos, que sentem prazer em ser reconhecidos como únicos.

Metamorfose ambulante

É dito que a identidade é um processo, pois você deve se lembrar do quanto o seu gosto, estilo e pensamento mudaram ao logo de sua vida. Ao recordarmos nossa evolução etária, ou a passagem da infância e adolescência até a idade adulta, podemos analisar essas mudanças de forma clara. Essa metamorfose está diretamente ligada aos fatores sociais que influenciam a formação da nossa identidade. E da mesma forma que nossa representação passa por transformações, nossas “coisas” também mudam, ou seja, aquilo que nos cerca está em constante metamorfose.

São pessoas, objetos, e claro, produtos de moda com diferentes discursos que participam dessa transformação de nós mesmos. Quantas pessoas nós julgávamos ser importantes para nossas vidas em diferentes momentos e hoje já não temos mais contato? Da mesma forma são inúmeros os itens que nos caracterizavam e já foram descartados. Carros, roupas, acessórios, cds, livros, filmes, todo o tipo de parafernália que consumimos possui o seu caráter simbólico que comunica o que somos ou desejamos ser. Mas se todas essas coisas já estão prontas e apenas consumimos para afirmar o nosso eu, então será que antes de sermos, somos ditos?

Os Grupos de Referências

As relações de socialização são um dos princípios da construção identitária dos sujeitos, pois apesar do termo identidade nos remeter ao que identifica como única cada pessoa, esse conceito também está ligado ao âmbito social, pois vivemos inseridos em grupos.

Quando falamos de identidade, os grupos referenciais são importantes para compreendermos como o meio em que estamos inseridos pode definir quem somos e o que consumimos e vestimos.

A busca pela identidade em sua esfera social faz com que os sujeitos tomem outros como referência, e nesse sentido é possível destacar quatro grupos em que nos baseamos para construir o discurso da nossa representação: o grupo primário, o secundário, o de associação e o de dissociação. O grupo primário abrange a pessoas tidas como próximas, aquelas com que temos contato direto, como familiares e amigos. No grupo secundário se encontram pessoas que não temos contato tão direto, mas que de alguma forma conhecemos, como indivíduos do mesmo local de trabalho.

Em relação ao grupo de associação nos espelhamos em pessoas ou coisas que nos remetem a ideias ou ideais que nos identificamos e queremos para nós como forma de identificação. Já o grupo de dissociação engloba aquilo que definimos como o que não nos identificamos e evitamos que seja associado a nós.

Em busca de um estilo próprio

Mas se nos baseamos em outros e consumimos coisas que nos são oferecidas para definirmos quem somos, como podemos ser nós mesmos?

Quanto à moda, o fato é que temos a possibilidade de nos camuflar, de nos apresentar publicamente de forma superficial parecendo verdadeira, ou segundo um modelo desejável, porém ocultando a essência do ser sob essa camada externa. Trata-se de um simulacro por meio do qual o sujeito pode se projetar, seja para ser reconhecido em um grupo, ou para se diferenciar dos demais.

Por isso, com essa composição do sistema vestimentar fazemos o uso de produtos como símbolos do eu. E é exatamente assim que somos quem nós somos. Consumimos para sentir que existimos segundo nossas preferencias e supostas particularidades, sempre passíveis de sofrer influencias de grupos que desejamos nos assemelhar ou não.

Para saber mais:

  • GARCIA, Carol; MIRANDA, Ana Paula de.  Moda é Comunicação – experiências, memórias, vínculos. 2.ed. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2007.
  • JACQUES, Maria da Graça Corrêa. Identidade. In: STREY, Marlene Neves et al.Psicologia Social Contemporânea: livro texto. Petrópolis: Vozes, 1998.
  • EMBACHER, Airton. Moda e identidade: a construção de um estilo próprio. São Paulo: Anhembi Morumbi, 1999.
Amanda Prado

Amanda Prado

Vinte e um anos, mineira, viveu no interior do Rio de Janeiro desde sempre até que a partir de 2011 se aventurou a morar em terras paranaenses para estudar Moda na Universidade Estadual de Maringá (UEM), mais especificamente em Cianorte, onde concluiu o curso de Moda em 2015, e não satisfeita, aproveitou a deixa e se formou em 2013 como técnica em vestuário pelo SENAI. Apaixonada por pesquisas acadêmicas, moda e áreas afins, mas acima de tudo consciente da necessidade da fomentação do campo de saber da moda.

Conteúdo relacionado

Comentários

Os comentários estão encerrados.

Consumo, Logo Existo

Por Amanda Prado

Eis-me aqui novamente deturpando as mais famosas citações de terceiros para colocar em foco alguns aspectos sobre moda. Então Descartes que me perdoe, mas a sentença colocada como título desse post ilustra perfeitamente o quadro atual de como os sujeitos se utilizam do consumo para formar suas identidades.

Proponho-me então a discorrer sobre possíveis relações entre o consumo de moda e a formação e reformulação da identidade dos indivíduos como processo. São apontamentos dolorosos para alguns (aqueles que se julgam originais), e boas novas para outros (aqueles que andam em bandos), afinal, o que é a identidade se não o eu X social?

A identidade e a Moda

Com o propósito de definir as pessoas como únicas, mas ao mesmo tempo representantes de papéis sociais, o conceito de identidade funciona de forma geral como o conjunto de traços, imagens e sentimentos que o indivíduo reconhece como fazendo parte dele próprio. Porém, a identidade é um processo mutável, o qual tende a se cristalizar com o tempo, mas que sempre está sujeito a mudanças.

No contexto atual, a identidade em seu caráter mais distintivo, quando age de fato com o seu potencial de diferenciação dos demais, torna as pessoas especiais. E se hoje a moda foge da distinção de classes, ela é um dos fatores utilizados para essa suposta particularização dos indivíduos, que sentem prazer em ser reconhecidos como únicos.

Metamorfose ambulante

É dito que a identidade é um processo, pois você deve se lembrar do quanto o seu gosto, estilo e pensamento mudaram ao logo de sua vida. Ao recordarmos nossa evolução etária, ou a passagem da infância e adolescência até a idade adulta, podemos analisar essas mudanças de forma clara. Essa metamorfose está diretamente ligada aos fatores sociais que influenciam a formação da nossa identidade. E da mesma forma que nossa representação passa por transformações, nossas “coisas” também mudam, ou seja, aquilo que nos cerca está em constante metamorfose.

São pessoas, objetos, e claro, produtos de moda com diferentes discursos que participam dessa transformação de nós mesmos. Quantas pessoas nós julgávamos ser importantes para nossas vidas em diferentes momentos e hoje já não temos mais contato? Da mesma forma são inúmeros os itens que nos caracterizavam e já foram descartados. Carros, roupas, acessórios, cds, livros, filmes, todo o tipo de parafernália que consumimos possui o seu caráter simbólico que comunica o que somos ou desejamos ser. Mas se todas essas coisas já estão prontas e apenas consumimos para afirmar o nosso eu, então será que antes de sermos, somos ditos?

Os Grupos de Referências

As relações de socialização são um dos princípios da construção identitária dos sujeitos, pois apesar do termo identidade nos remeter ao que identifica como única cada pessoa, esse conceito também está ligado ao âmbito social, pois vivemos inseridos em grupos.

Quando falamos de identidade, os grupos referenciais são importantes para compreendermos como o meio em que estamos inseridos pode definir quem somos e o que consumimos e vestimos.

A busca pela identidade em sua esfera social faz com que os sujeitos tomem outros como referência, e nesse sentido é possível destacar quatro grupos em que nos baseamos para construir o discurso da nossa representação: o grupo primário, o secundário, o de associação e o de dissociação. O grupo primário abrange a pessoas tidas como próximas, aquelas com que temos contato direto, como familiares e amigos. No grupo secundário se encontram pessoas que não temos contato tão direto, mas que de alguma forma conhecemos, como indivíduos do mesmo local de trabalho.

Em relação ao grupo de associação nos espelhamos em pessoas ou coisas que nos remetem a ideias ou ideais que nos identificamos e queremos para nós como forma de identificação. Já o grupo de dissociação engloba aquilo que definimos como o que não nos identificamos e evitamos que seja associado a nós.

Em busca de um estilo próprio

Mas se nos baseamos em outros e consumimos coisas que nos são oferecidas para definirmos quem somos, como podemos ser nós mesmos?

Quanto à moda, o fato é que temos a possibilidade de nos camuflar, de nos apresentar publicamente de forma superficial parecendo verdadeira, ou segundo um modelo desejável, porém ocultando a essência do ser sob essa camada externa. Trata-se de um simulacro por meio do qual o sujeito pode se projetar, seja para ser reconhecido em um grupo, ou para se diferenciar dos demais.

Por isso, com essa composição do sistema vestimentar fazemos o uso de produtos como símbolos do eu. E é exatamente assim que somos quem nós somos. Consumimos para sentir que existimos segundo nossas preferencias e supostas particularidades, sempre passíveis de sofrer influencias de grupos que desejamos nos assemelhar ou não.

Para saber mais:

  • GARCIA, Carol; MIRANDA, Ana Paula de.  Moda é Comunicação – experiências, memórias, vínculos. 2.ed. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2007.
  • JACQUES, Maria da Graça Corrêa. Identidade. In: STREY, Marlene Neves et al.Psicologia Social Contemporânea: livro texto. Petrópolis: Vozes, 1998.
  • EMBACHER, Airton. Moda e identidade: a construção de um estilo próprio. São Paulo: Anhembi Morumbi, 1999.
Amanda Prado

Amanda Prado

Vinte e um anos, mineira, viveu no interior do Rio de Janeiro desde sempre até que a partir de 2011 se aventurou a morar em terras paranaenses para estudar Moda na Universidade Estadual de Maringá (UEM), mais especificamente em Cianorte, onde concluiu o curso de Moda em 2015, e não satisfeita, aproveitou a deixa e se formou em 2013 como técnica em vestuário pelo SENAI. Apaixonada por pesquisas acadêmicas, moda e áreas afins, mas acima de tudo consciente da necessidade da fomentação do campo de saber da moda.

Conteúdo relacionado

Comentários

Os comentários estão encerrados.