Códigos Abertos – Design da Favela

Por Rob Batista

E meu post anterior, falei sobre como as limitações impostas à forma como entendemos o design estão em descompasso com as próprias necessidades e contextos que invocam a prática de nossa atividade atualmente. Hoje, trago aqui um exemplo que serve muito bem de ilustração para essa reflexão e pode trazer consigo mais provocações. Se trata da exposição Design da Favela, que aconteceu entre novembro e dezembro de 2012. Apesar de já ter passado, com certeza foi uma iniciativa capaz de gerar muitos frutos para quem esteve envolvido e apontar para a possibilidade de uma honestidade maior do design em relação à si mesmo.

A exposição Design da Favela, que teve curadoria de Ricardo Saint-Clair e Rodrigo Westin, e patrocínio da Prefeitura do Rio de Janeiro, pretendia trazer à tona o fato de que muito daquilo que entendemos como necessário para identificar algo como sendo design, ou um processo de design, pode estar presente no dia-a-dia de todas as pessoas, revelando-se como atividade humana que vem muito antes (e vai muito além) de uma profissão. Em certo sentido (e, talvez, o sentido mais realista) todos somos designers.

De acordo com os organizadores, um dos objetivos da exposição “é estreitar as relações entre as comunidades pesquisadas e o universo formal do design no Rio, estimulando o acesso à formação acadêmica e ao contato com a indústria, o comércio e as entidades de fomento públicas e privadas, assim como o uso das soluções expostas na melhoria da qualidade de vida na cidade e em outros bairros periféricos”.

Foto: Stefano Figalo

Foto: Stefano Figalo

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Dando a esse tipo de iniciativa a importância que tem, percebe-se que é cada vez mais difícil (ou superficial) querer submeter o design aos contornos da prática de uma profissão sem pensar nele também fora dessa profissão. Seja qual for a definição que damos para o design (projeto, processo ou planejamento), nenhuma delas consegue escapar da tarefa de também querer explicar nosso próprio comportamento humano. O homem não começou a projetar coisas que sejam úteis ou que gerem significados a partir da Revolução Industrial, ele já o fazia antes e continua projetando coisas para si, e até mesmo reprocessando coisas que não foram projetadas por ele. Quando alguém quer utilizar algo fora de sua função, ele não vai até um designer pedir permissão ou ajuda, mas toma a liberdade de reinterpretar aquele objeto e de fazer as alterações possíveis e necessárias (as gambiarras).

Da mesma forma, quando tomamos decisões ou fazemos escolhas, geralmente submetemos essas coisas (conscientes ou não) a processos idênticos aos que poderíamos identificar na atividade de um designer, o que muda é o suporte. Sendo assim, o design pode ser muito bem entendido, para além de uma profissão, não só como atividade humana, mas também como conduta existencial.

E é justamente isso que a exposição Design da Favela mostra: como as pessoas que vivem nas comunidades carentes do Rio de Janeiro tomam a iniciativa de transformar, repensar, projetar e reprocessar aquilo que está à sua frente. É a expressão de um design (um processar, projetar ou planejar de suas coisas e realidades) carregado de uma carga muito mais intuitiva e menos presa à metodologias que se querem científicas e nem sempre podem cumprir o que prometem. Não é um design direcionado por tendências de mercado, mas invocado pelas próprias necessidades dessas pessoas, e tão natural à elas que nem sequer precisa ter esse nome cheio de pompa: design.

Quando estão diante da pergunta “o que é design?”, os personagens buscados durante nove meses pelos curadores, geralmente chegam a definições bastante abertas e sem qualquer fundamentação teórica. A princípio, poderíamos dizer que estão recorrendo aos clichês ou estereótipos propagados sobre design, mas se prestar bastante atenção, logo se percebe que, mesmo com toda a simplicidade, esses criadores conseguem perceber que o design, de alguma forma, é um meio de articulação de suas próprias realidades.

Rob Batista

Rob Batista

Rob Batista, aka Robin Hood, é paulista e estudante de Design Digital pela Universidade Anhembi Morumbi. Se encontra (e se perde) em Artes Visuais, Antropologia, Filosofia, Ficção Científica, entre outras coisas, e vê no design o poder de (des)construir o mundo. Suas pesquisas, observações e toda a bobagem que fala são muito menos o desejo de explicar e muito mais a tentativa de entender.

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Por Rob Batista

E meu post anterior, falei sobre como as limitações impostas à forma como entendemos o design estão em descompasso com as próprias necessidades e contextos que invocam a prática de nossa atividade atualmente. Hoje, trago aqui um exemplo que serve muito bem de ilustração para essa reflexão e pode trazer consigo mais provocações. Se trata da exposição Design da Favela, que aconteceu entre novembro e dezembro de 2012. Apesar de já ter passado, com certeza foi uma iniciativa capaz de gerar muitos frutos para quem esteve envolvido e apontar para a possibilidade de uma honestidade maior do design em relação à si mesmo.

A exposição Design da Favela, que teve curadoria de Ricardo Saint-Clair e Rodrigo Westin, e patrocínio da Prefeitura do Rio de Janeiro, pretendia trazer à tona o fato de que muito daquilo que entendemos como necessário para identificar algo como sendo design, ou um processo de design, pode estar presente no dia-a-dia de todas as pessoas, revelando-se como atividade humana que vem muito antes (e vai muito além) de uma profissão. Em certo sentido (e, talvez, o sentido mais realista) todos somos designers.

De acordo com os organizadores, um dos objetivos da exposição “é estreitar as relações entre as comunidades pesquisadas e o universo formal do design no Rio, estimulando o acesso à formação acadêmica e ao contato com a indústria, o comércio e as entidades de fomento públicas e privadas, assim como o uso das soluções expostas na melhoria da qualidade de vida na cidade e em outros bairros periféricos”.

Foto: Stefano Figalo

Foto: Stefano Figalo

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Foto: Ricardo Saint-Clair

Dando a esse tipo de iniciativa a importância que tem, percebe-se que é cada vez mais difícil (ou superficial) querer submeter o design aos contornos da prática de uma profissão sem pensar nele também fora dessa profissão. Seja qual for a definição que damos para o design (projeto, processo ou planejamento), nenhuma delas consegue escapar da tarefa de também querer explicar nosso próprio comportamento humano. O homem não começou a projetar coisas que sejam úteis ou que gerem significados a partir da Revolução Industrial, ele já o fazia antes e continua projetando coisas para si, e até mesmo reprocessando coisas que não foram projetadas por ele. Quando alguém quer utilizar algo fora de sua função, ele não vai até um designer pedir permissão ou ajuda, mas toma a liberdade de reinterpretar aquele objeto e de fazer as alterações possíveis e necessárias (as gambiarras).

Da mesma forma, quando tomamos decisões ou fazemos escolhas, geralmente submetemos essas coisas (conscientes ou não) a processos idênticos aos que poderíamos identificar na atividade de um designer, o que muda é o suporte. Sendo assim, o design pode ser muito bem entendido, para além de uma profissão, não só como atividade humana, mas também como conduta existencial.

E é justamente isso que a exposição Design da Favela mostra: como as pessoas que vivem nas comunidades carentes do Rio de Janeiro tomam a iniciativa de transformar, repensar, projetar e reprocessar aquilo que está à sua frente. É a expressão de um design (um processar, projetar ou planejar de suas coisas e realidades) carregado de uma carga muito mais intuitiva e menos presa à metodologias que se querem científicas e nem sempre podem cumprir o que prometem. Não é um design direcionado por tendências de mercado, mas invocado pelas próprias necessidades dessas pessoas, e tão natural à elas que nem sequer precisa ter esse nome cheio de pompa: design.

Quando estão diante da pergunta “o que é design?”, os personagens buscados durante nove meses pelos curadores, geralmente chegam a definições bastante abertas e sem qualquer fundamentação teórica. A princípio, poderíamos dizer que estão recorrendo aos clichês ou estereótipos propagados sobre design, mas se prestar bastante atenção, logo se percebe que, mesmo com toda a simplicidade, esses criadores conseguem perceber que o design, de alguma forma, é um meio de articulação de suas próprias realidades.

Rob Batista

Rob Batista

Rob Batista, aka Robin Hood, é paulista e estudante de Design Digital pela Universidade Anhembi Morumbi. Se encontra (e se perde) em Artes Visuais, Antropologia, Filosofia, Ficção Científica, entre outras coisas, e vê no design o poder de (des)construir o mundo. Suas pesquisas, observações e toda a bobagem que fala são muito menos o desejo de explicar e muito mais a tentativa de entender.

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