Foto documental: ficar ou casar?

Por Guto Souza

A maioria dos fotógrafos são apaixonados pelo que fazem. Mas, no caso dos fotodocumentaristas, um verdadeiro relacionamento é desenvolvido com o assunto fotografado. Não é que fotógrafo e fotografado tenham um caso amoroso (ok, a não ser em casos como esse). Mas o exercício da fotografia documental pode exigir mais ou menos tempo e dedicação, o que geralmente influencia na profundidade do trabalho.

Fazendo uma analogia com os relacionamentos afetivos, podemos dizer que existem os fotógrafos que ficam, os que namoram e até os que casam com seus temas. Tudo depende do objetivo que têm. Vou exemplificar para você entender melhor.

Certa feita, Márcio Vasconcelos ficou com a tribo Tenetehara da aldeia Lagoa Quieta, especialmente com as adolescentes. Ele retratou a Festa do Moqueado que ocorreu por lá em 2008. Desenvolveu um relacionamento interessante, porém efêmero, superficial. Nessa série de fotos Vasconcelos nos conta muito pouco sobre a aldeia e seus costumes, pois mostra somente um evento isolado.

A Festa do Moqueado marca a introdução das adolescentes Tenetehara à vida adulta (foto por Márcio Vasconcelos, 2008)

A Festa do Moqueado marca a introdução das adolescentes Tenetehara à vida adulta (foto por Márcio Vasconcelos, 2008)

Já Henri Cartier-Bresson teve, em 1954, um namorico com a dona União Soviética. Também não foi um relacionamento longevo (apenas poucas semanas), mas o ensaio fotográfico de Bresson apresentou ao mundo ocidental diversos detalhes da vida socialista. O breve tempo, no entanto, impediu o fotógrafo de nos contar um pouco mais – faltou conhecer algum podre, talvez?

Bresson foi o primeiro estrangeiro a fotografar a URSS após a morte de Stalin, e suas fotos tiveram grande repercussão na mídia ocidental (1954)

Bresson foi o primeiro estrangeiro a fotografar a URSS após a morte de Stalin, e suas fotos tiveram grande repercussão na mídia ocidental (1954)

Agora, quem gosta de relacionamentos duradouros é Sebastião Salgado. O homem passou sete anos casado com trabalhadores, dezesseis com pessoas sem terra, e, no momento, comemora um casamento de oito anos com os povos das regiões mais inóspitas do planeta. Por conta de tamanho envolvimento na busca pela compreensão do comportamento humano, o trabalho de Salgado é reconhecido como um verdadeiro tratado sociológico.

Sebastião Salgado rodou o globo à procura de populações que preservam intocadas suas tradições (2008)"

Sebastião Salgado rodou o globo à procura de populações que preservam intocadas suas tradições (2008)”

Ficar ou casar, menor ou maior proximidade, são, portanto, opções do fotógrafo. A escolha é feita de acordo com a maneira com que se pretende tratar o tema. Aliás, em geral o fotógrafo documental é poligâmico, e pode assumir diferentes tipos de relacionamentos com diferentes temas. No fim, o importante mesmo é ter uma boa história para contar.

Guto Souza

Guto Souza

Guto Souza nasceu e vive em Curitiba. Publicitário por formação e fotógrafo por paixão. Clica diferentes temáticas e linguagens em busca das suas próprias. Seus textos sobre Fotografia são publicados aos sábados, quinzenalmente.

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Foto documental: ficar ou casar?

Por Guto Souza

A maioria dos fotógrafos são apaixonados pelo que fazem. Mas, no caso dos fotodocumentaristas, um verdadeiro relacionamento é desenvolvido com o assunto fotografado. Não é que fotógrafo e fotografado tenham um caso amoroso (ok, a não ser em casos como esse). Mas o exercício da fotografia documental pode exigir mais ou menos tempo e dedicação, o que geralmente influencia na profundidade do trabalho.

Fazendo uma analogia com os relacionamentos afetivos, podemos dizer que existem os fotógrafos que ficam, os que namoram e até os que casam com seus temas. Tudo depende do objetivo que têm. Vou exemplificar para você entender melhor.

Certa feita, Márcio Vasconcelos ficou com a tribo Tenetehara da aldeia Lagoa Quieta, especialmente com as adolescentes. Ele retratou a Festa do Moqueado que ocorreu por lá em 2008. Desenvolveu um relacionamento interessante, porém efêmero, superficial. Nessa série de fotos Vasconcelos nos conta muito pouco sobre a aldeia e seus costumes, pois mostra somente um evento isolado.

A Festa do Moqueado marca a introdução das adolescentes Tenetehara à vida adulta (foto por Márcio Vasconcelos, 2008)

A Festa do Moqueado marca a introdução das adolescentes Tenetehara à vida adulta (foto por Márcio Vasconcelos, 2008)

Já Henri Cartier-Bresson teve, em 1954, um namorico com a dona União Soviética. Também não foi um relacionamento longevo (apenas poucas semanas), mas o ensaio fotográfico de Bresson apresentou ao mundo ocidental diversos detalhes da vida socialista. O breve tempo, no entanto, impediu o fotógrafo de nos contar um pouco mais – faltou conhecer algum podre, talvez?

Bresson foi o primeiro estrangeiro a fotografar a URSS após a morte de Stalin, e suas fotos tiveram grande repercussão na mídia ocidental (1954)

Bresson foi o primeiro estrangeiro a fotografar a URSS após a morte de Stalin, e suas fotos tiveram grande repercussão na mídia ocidental (1954)

Agora, quem gosta de relacionamentos duradouros é Sebastião Salgado. O homem passou sete anos casado com trabalhadores, dezesseis com pessoas sem terra, e, no momento, comemora um casamento de oito anos com os povos das regiões mais inóspitas do planeta. Por conta de tamanho envolvimento na busca pela compreensão do comportamento humano, o trabalho de Salgado é reconhecido como um verdadeiro tratado sociológico.

Sebastião Salgado rodou o globo à procura de populações que preservam intocadas suas tradições (2008)"

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Ficar ou casar, menor ou maior proximidade, são, portanto, opções do fotógrafo. A escolha é feita de acordo com a maneira com que se pretende tratar o tema. Aliás, em geral o fotógrafo documental é poligâmico, e pode assumir diferentes tipos de relacionamentos com diferentes temas. No fim, o importante mesmo é ter uma boa história para contar.

Guto Souza

Guto Souza

Guto Souza nasceu e vive em Curitiba. Publicitário por formação e fotógrafo por paixão. Clica diferentes temáticas e linguagens em busca das suas próprias. Seus textos sobre Fotografia são publicados aos sábados, quinzenalmente.

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