Algumas palavras e muitos links sobre mudanças de identidade visual

Por Dario Jofilly

Eu não sei vocês, mas toda grande mudança de identidade visual que aparece por aí, eu sinto a mesma sensação: a de que discussões homéricas com opiniões extremistas vão pipocar na minha timeline por mais tempo do que o necessário. Obviamente, esse não é um texto que vá no caminho contrário à discussão ou às críticas. Até porque isso seria uma imensa hipocrisia, quem me conhece, sabe que eu sou um cara muito crítico (isso pra não dizer chato).

Talvez o que mais me incomode em parte dessas discussões é a ausência daquilo que mais me dá tesão no design: a noção de totalidade. É essa preocupação com todo o contexto de um projeto que leva um designer a pensar tanto no kerning, que permite a legibilidade da menor aplicação de uma logo, quanto na durabilidade do material, que será usado para valorizar as cores daquela mesma logo na fachada de um prédio. O que complica um pouco a história é que não são apenas questões “diretamente” ligadas ao exercício da profissão que estão em jogo nesses projetos.

Entram em cena também questões mercadológicas, jurídicas, políticas, gostos do cliente, inúmeras demandas que podem, e muitas vezes são, vistas como obstáculos ao exercício criativo. Aqui já posso entrar com um clichê e dizer que “todo obstáculo é uma oportunidade”, mas nem me limito a isso. Prefiro lembrar que quando defendemos uma noção de design mais amplo, que não se limite a questões “técnicas”, estamos defendendo também uma gestão pensada na perspectiva do design. Logo, que passa a encarar todas essas questões como parte essencial do briefing. Esses dois conceitos mágicos, sobre os quais temos ouvido muito recentemente, branding e design thinking, são, sinto dizer, resultado também do marketing, palavra essa que deixa muito designer de cabelo em pé.

Assim, sempre que me deparo com um projeto polêmico, como essa recente mudança de identidade visual dos Correios, me lembro de análises de outros tantos projetos tão ou mais polêmicos. Recorro principalmente ao BrandNew, blog focado em identidade visual e branding, da UnderConsideration, empresa de design que coordena vários projetos na área, e ao LogoBR, blog coordenado pelo Daniel Campos cujas críticas são sempre muito maduras e que já foi entrevistado aqui pelo ClicheCast. Ao mesmo tempo, reforço, longe de mim pensar que tenho o direito de sair por aí julgando se estamos sendo maduros ou não ao falar mal dos novíssimos degradês dos Correios. Meu interesse é apenas compartilhar aqui alguns dessas análises que foram marcantes pra mim e que moldaram meu olhar e, se possível, conhecer exemplos que também foram importantes no crescimento pessoal e profissional de cada um de vocês.

O pano de fundo do maior evento esportivo do mundo

O pano de fundo do maior evento esportivo do mundo

Talvez um dos mais marcantes para mim é o case das Olimpíadas de Londres de 2012 que é grande exemplo de como o tempo e a maturação de um projeto desse porte pode mudar opiniões. Ele rendeu uma longa discussão no Speak Up, quase como um “blog mãe” do BrandNew, e cujo post já elogia o caminho revolucionário que a logo propõe. Enquanto isso, no LogoBR o Daniel Campos publicou um texto à época apresentando duas opiniões distintas do projeto e quatro anos depois escreveu um segundo “saindo do muro”.  Ainda sobre o assunto, o Fábio Lopez montou a palestra O legado visual dos Jogos Olímpicos de Londres 2012 e, apesar de nunca ter tido a oportunidade de conferi-la pessoalmente, encontrei disponibilizado por ele esse documento incrível sobre o projeto.

Outro exemplo interessante de lembrar é o da GAP, que mudou de logo mas voltou atrás tamanha a repercussão negativa. No BrandNew podemos acompanhar a mudança, os confusos eventos que se seguiram, a mudança de volta para a original e ainda uma entrevista com o responsável pela conta no Twitter @GapLogo. Novamente, Daniel Campos trata do assundo no LogoBr de maneira bem completa e mostra como a agência de publicidade L+P estava fazendo um ótimo trabalho nas campanhas publicitárias com a Helvetica e fez um péssimo trabalho na logo também com a Helvetica. Aqui cabe um paralelo com o famoso fracaso da New Coke, lançamento da Coca-Cola em 1985 que tinha uma fórmula mais doce e que iria substituir a versão original. A reação do público foi mais próxima de uma revolta popular e a empresa mudou de postura, diante da paixão dos consumidores por uma marca símbolo pro povo americano.

Caminhando ainda mais para a publicidade, esse universo tão distante e tão próximo, parte dessa discussão se materializa nas figuras do planner e do criativo. Então, temos aqui um planner a defender como “planejamento não serve pra nada e é chato pra cacete” e aqui um diretor de criação que diz que “criação e planejamento são a mesma coisa”. Tem também uma série de entrevistas de alguns dos maiores profissionais de comunicação feitas pelo pelo Bruno Scartozzoni, embaixador do LinkedIn no Young Lions Brasil 2013. Entre as entrevistadas estão Tania Savaget, Diretora de Estratégia e Branding da Tátil Design, Mariana Stanisci, Diretora de Marcas Mainstream da Heineken e Cecilia Troiano, Diretora Geral do Grupo Troiano de Branding, três entrevistas incríveis com diferentes perspectivas sobre gestão de marca.

A zoeira... ela não tem limites

A zoeira… ela não tem limites

Já no caso do Yahoo! a necessidade estratégica de mudança era bastante clara, mas a maneira como a mudança se deu foi muito questionada. Os 29 dias de espera e de expectativa culminaram em uma logo em Optima retorcida dentro de um grid. Além de uma dupla visão estratégica e técnica, o LogoBR discute também essa questão do grid, uma discussão a ser muito bem complementada com esse texto do Guilherme Sebastiany sobre malhas construtivas.

Mas, de todas essas mudanças, a história que mais se aproxima da dos Correios, a meu ver, é a da American Airlines. Ambas as marcas precisavam urgentemente de uma reestruturação, ambas as logos tinham sua origem estética no modernismo e ambas as novas logos tem uma pegada “gradiente”. Claro que no caso da companhia área americana, a logo anterior era feita pelo mestre Massimo Vignelli e, muitas das críticas que foram feitas ao projeto, se ofendiam já com a ideia de aposentar um projeto dele. Por outro lado, a esperada resenha do BrandNew pegou muita gente de surpresa ao defender a reformulação avidamente. Tão avidamente, em fato, que levou a equipe a publicar uma segunda opinião, coisa que eles raramente fazem. No LogoBR, foi apresentado mais um texto pesando ambos os lados da questão e questionando também esse pedestal no qual às vezes colocamos projetos como esse. De longe é um dos textos que mais aconselho aqui, pois ele não apenas expõe o próprio modernismo como uma tendência de época, como defende a relevância da publicidade, o que é, pra mim, sempre divertido ouvir de um designer.

A logo já pronta pra peças publicitárias

A logo já pronta pra peças publicitárias

Agora, tendo passado por tantas reformulações, podemos voltar ao case dos Correios. Logo de início, aconselho o texto da Carolina Sangiovanni no Choco la Design que aponta como os Correios optam sempre por falar de “uma nova marca” e não de “uma nova logo”. Em teoria isso se dá porque a empresa pretende expandir suas áreas de atuação como autorizado pela lei 12.490/11. Mas o que Carolina e muitos outros no nosso país questionam é: se os Correios continuam pecando descaradamente na sua área de atuação original, como esperam ter sucesso como marca em outros setores? Além disso muitas das críticas feitas à mudança da logo nada tem relação com opções estéticas e sim com os gastos. Mesmo ao se propor a responder às questões levantadas pelo jornalista da UOL, a instituição também deixa muito em aberto. Se nosso interesse é pensar o design de maneira ampla e completa, é nossa tarefa também considerar questões como essas.

Como o título desse post já avisava, no fim das contas eu mesmo não falei muita coisa. Principalmente porque creio que esse monte de links que compartilhei aqui são bem mais adequados do qualquer opinião pessoal minha. Mas talvez também por que acredito que não há tanto a se dizer de mudanças de identidade visual em geral. Cada caso será um, e antes de berrarmos nossas críticas no vazio existencial da internet, sempre será preciso avaliar o contexto da história toda pra realmente termos uma opinião embasada. Claro que existem as opiniões não embasadas também, sem nenhum problema. Eu, por exemplo, amo o S do lettering antigo dos Correios e vou morrer de saudade dele, mas tudo bem.

 

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Dario Jofilly

Dario Jofilly

Quase se formando em (quem diria?) Publicidade e Propaganda pelo curso de Comunicação Social da UnB, se pergunta como vai conseguir sobreviver e continuar estudando design, arte e imagem. Enquanto isso, aproveita a experiência única que é viver em Brasília.

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