Arte e homossexualidade – do Império Bizantino à contemporaneidade
A história da relação da sociedade com a homossexualidade é bastante curiosa porque é mutante: ora é socialmente aceita e estimulada a homossexualidade (homens na Grécia, só para citar um exemplo bem clichê). A arte exerce um enorme papel como retrato de época, cultura e pensamento e, no caso de uma mutação constante como são os ideais, preceitos e preconceitos de povos e culturas, é no mínimo curioso observar através do viés artístico os pensamentos de diversas épocas sobre corpo, gênero e sexualidade e se dar conta de que – MEU! – na Dinastia Qing tiveram gravuras maravilhosas de sexo entre homossexuais e quando passa um beijo gay na novela a galera estremece as bases. Vai entender.
Na Roma Antiga o sexo entre dois homens era “permitido” socialmente (menos se fossem dois homens livres (?)) e com a queda do Império Romano a Europa deu uma enorme retrocedida no que diz respeito aos pensamentos libertários e a arte tomou um ar totalmente puritano. Não à toa que em esculturas de povos latinos não tem pudor algum, visto que antes da doutrinização católica imposta pelos europeus não havia um contato das culturas latinas com a cultura cristã. Aliás: o erotismo homossexual da arte não era nem um pouco pudico; era sem pudor algum mesmo.
O próprio pintor Rubens, por exemplo, do estilo barroco. Suas pinturas são extremamente exageradas e helenísticas o que combina muito com, isso mesmo, pinturas sacras. Ao mesmo tempo ele retratava a sensualidade de um jeito totalmente natural e sem muito pudor: ele não era um cara que queria desenhar pessoas e corpos perfeitos, gostava de umas bundas com dobrinhas e umas bizarrices. Ou seja, mesmo sendo um pintor como o tempo recomendava (cristão, rebuscado, etc), ele também curtia chocar um pouquinho. Em um caso específico, Rubens retrata o momento em que Júpiter em uma metamorfose que o transforma na Diana, seduz a virgem Calisto.
E hoje luta-se pela causa gay. Um pouco triste de pensar que hoje se restringe o que há milênios era socialmente permitido. Fazer o que, os pensamentos são cinéticos e estão em constante mudança. E essa luta através da arte é bastante poética e brutal, ecoa como um tapa na cara (acho que é uma ótima representação pro termo “tapa na cara da sociedade”) principalmente por causa do principal meio de como ela é feita: através da fotografia.
Na fotografia entitulada “Kissing Policemen (An Epoch of Clemency)” dois homens fardados são encontrados em uma floresta se beijando: eles são a figura central em um fortíssimo contraste com a floresta quase que em preto e branco. O tapa na cara é de que, olha, somos fardados, mas isso não quer dizer que sou obrigado a ser o homem que uma sociedade heteronormativa quer e eu quero beijar meu colega porque eu me sinto muito atraído por ele. E você não tem nada a ver com isso, apesar de eu ter que me esconder numa floresta na neve pra eu não te ofender.
Fala sério, olha essa foto. Tem coisa mais verdadeira que o cotidiano de uma pilha de louça pra secar, uma geladeira cheia de penduricalho, luz entrando de leve numa porta e o chão de lajota de madeira vagabunda? Daí me colocam dois homens liricamente e lindamente se beijando no centro da fotografia, o que grita: meu, nós somos normais, lide com isso.
A linda fotógrafa Hanna Jarzabek fez uma exposição de fotografias sensivelmente íntimas (como essa foto) de casais de lésbicas. A maior parte das fotografias de casais lésbicos é simplesmente pra estimular fantasias dos homens hetero, tem um cunho sensual extremamente apelativo. Mas a Hanna fez isso de uma forma tão sensível: ela não retrata apenas o sexo lésbico, mas o amor lésbico, a intimidade, a cumplicidade, a união.
A contemporaneidade é complexa justamente pela sua incoerência e por ser extremamente controversa. Somos muito mais evoluídos que as pessoas do império romano, supostamente, mas pertencemos a uma sociedade recheada de tabus hipócritas e desculpas mais esdrúxulas ainda. E a arte tá aí, fazendo o seu papel.
ps: esse post é em homenagem às pessoas que vivem em uma ditadura gayzista e que não deseja mal aos gays, desde que eles fiquem bem longe.
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