Arte e homossexualidade – do Império Bizantino à contemporaneidade

Por Isabela Fuchs

 

A história da relação da sociedade com a homossexualidade  é bastante curiosa porque é mutante: ora é socialmente aceita e estimulada a homossexualidade (homens na Grécia, só para citar um exemplo bem clichê). A arte exerce um enorme papel como retrato de época, cultura e pensamento e, no caso de uma mutação constante como são os ideais, preceitos e preconceitos de povos e culturas, é no mínimo curioso observar através do viés artístico os pensamentos de diversas épocas sobre corpo, gênero e sexualidade e se dar conta de que – MEU! – na Dinastia Qing tiveram gravuras maravilhosas de sexo entre homossexuais e quando passa um beijo gay na novela a galera estremece as bases. Vai entender.

Na Roma Antiga o sexo entre dois homens era “permitido” socialmente (menos se fossem dois homens livres (?)) e com a queda do Império Romano a Europa deu uma enorme retrocedida no que diz respeito aos pensamentos libertários e a arte tomou um ar totalmente puritano. Não à toa que em esculturas de povos latinos não tem pudor algum, visto que antes da doutrinização católica imposta pelos europeus não havia um contato das culturas latinas com a cultura cristã. Aliás: o erotismo homossexual da arte não era nem um pouco pudico; era sem pudor algum mesmo.Cerâmica no Império Romano

Taça Warren

O próprio pintor Rubens, por exemplo, do estilo barroco. Suas pinturas são extremamente exageradas e helenísticas o que combina muito com, isso mesmo, pinturas sacras. Ao mesmo tempo ele retratava a sensualidade de um jeito totalmente natural e sem muito pudor: ele não era um cara que queria desenhar pessoas e corpos perfeitos, gostava de umas bundas com dobrinhas e umas bizarrices. Ou seja, mesmo sendo um pintor como o tempo recomendava (cristão, rebuscado, etc), ele também curtia chocar um pouquinho. Em um caso específico, Rubens retrata o momento em que Júpiter em uma metamorfose que o transforma na Diana, seduz a virgem Calisto.

Calisto e Júpiter

E hoje luta-se pela causa gay. Um pouco triste de pensar que hoje se restringe o que há milênios era socialmente permitido. Fazer o que, os pensamentos são cinéticos e estão em constante mudança. E essa luta através da arte é bastante poética e brutal, ecoa como um tapa na cara (acho que é uma ótima representação pro termo “tapa na cara da sociedade”) principalmente por causa do principal meio de como ela é feita: através da fotografia.

Na fotografia entitulada “Kissing Policemen (An Epoch of Clemency)” dois homens fardados são encontrados em uma floresta se beijando: eles são a figura central em um fortíssimo contraste com a floresta quase que em preto e branco. O tapa na cara é de que, olha, somos fardados, mas isso não quer dizer que sou obrigado a ser o homem que uma sociedade heteronormativa quer e eu quero beijar meu colega porque eu me sinto muito atraído por ele. E você não tem nada a ver com isso, apesar de eu ter que me esconder numa floresta na neve pra eu não te ofender.

Fala sério, olha essa foto. Tem coisa mais verdadeira que o cotidiano de uma pilha de louça pra secar, uma geladeira cheia de penduricalho, luz entrando de leve numa porta e o chão de lajota de madeira vagabunda? Daí me colocam dois homens liricamente e lindamente se beijando no centro da fotografia, o que grita: meu, nós somos normais, lide com isso.

A linda fotógrafa Hanna Jarzabek fez uma exposição de fotografias sensivelmente íntimas (como essa foto) de casais de lésbicas. A maior parte das fotografias de casais lésbicos é simplesmente pra estimular fantasias dos homens hetero, tem um cunho sensual extremamente apelativo. Mas a Hanna fez isso de uma forma tão sensível: ela não retrata apenas o sexo lésbico, mas o amor lésbico, a intimidade, a cumplicidade, a união.

A contemporaneidade é complexa justamente pela sua incoerência e por ser extremamente controversa. Somos muito mais evoluídos que as pessoas do império romano, supostamente, mas pertencemos a  uma sociedade recheada de tabus hipócritas e desculpas mais esdrúxulas ainda. E a arte tá aí, fazendo o seu papel.

ps: esse post é em homenagem às pessoas que vivem em uma ditadura gayzista e que não deseja mal aos gays, desde que eles fiquem bem longe.

Isabela Fuchs

Isabela Fuchs

Estudante de Design na UTFPR. Apaixonada por História da Arte, mas também nutro paixões paralelas como Design Editorial, Design de Embalagens e Tipografia.

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