Do cinema ao design nem tão ficcional

Por Gustavo Henrique

O cinema, desde sua origem, adotou a ficção científica como grande fonte de inspiração. São inúmeras produções que ganharam não só o gosto popular como também dos mais exigentes críticos da área. Mas há o que questionar-se, afinal o que te atrai nesses filmes?
A resposta não é difícil. Todos nós já sonhamos, imaginamos ou discutimos como seria o mundo daqui alguns anos ou até mesmo em milênios. A curiosidade, a vontade de experimentar algo extremamente tecnológico e diferente do que temos atualmente faz parte de nossas vidas. E o cinema, mais do que qualquer outro meio, consegue ilustrar tudo isso.
Cineastas de diversos estilos, em diferentes épocas sonharam com o futuro, com viagens fantásticas, máquinas esplêndidas e realidades magníficas. A saga Star Wars é um excelente exemplo; a criação de George Lucas é mais do que incrível. Naves, armas e robôs jamais antes imaginados,  em filmes de produções excelentes, levando-se em conta os recursos da época. Matrix, A Origem, Avatar, O Exterminador do Futuro e até mesmo a animação Wall-E são outros exemplos. Todos esses trazem coisas que não existem em nosso tempo, mas que não são completamente irreais. Desde máquinas até formas de vidas foram imaginadas com base em hipóteses plausíveis ou mesmo em pesquisas.

Cenas dos filmes Star Wars, Matrix, A Origem, Avatar, O Exterminador do Futuro e Wall-E

Claro que, no cinema, tudo é mais fácil. Afinal, por mais impossíveis que sejam, essas realidades futuras podem ser encenadas com maestria, por meio de uma boa direção de arte e recursos. Citemos “O Curioso Caso de Benjamin Button”; o filme usou uma tecnologia inédita para transformar a face do ator Brad Pitt que, na história, nasce velho e vai rejuvenescendo com o passar dos anos. Os artistas responsáveis pelo efeito não só conseguiram atingir seu objetivo como o fizeram com maestria.  Vale dizer que o projeto foi trabalhoso e adiado por anos até que fosse possível sua realização. Sem mencionar que o enredo também propicia a discussão de valores — algo que pode dar uma discussão bem longa, mas resumidamente: a busca cada vez maior pelo rejuvenescimento, que de uma forma um tanto quanto questionável também se encaixa ao tema — , pelo menos até certo ponto.

O Curioso Caso de Benjamin Button

Pensar além do ponto em que estamos pode ser útil. Imaginar algo completamente surreal pode abrir a nossa mente para algo passível de se concretizar. Se o cinema pode, por que o design não? E até que ponto pode-se imaginar, em design?

Pode-se dizer que as ficções do design surgiram devido ao desejo de materializar tudo o que estava nas telas. Não só máquinas, veículos e acessórios, mas também modos de civilização e comportamento. Em um âmbito mais fantasioso, longas viagens espaciais, viagens no tempo e super-andróides. Com o tempo, começaram surgir os primeiros frutos. Com muitos erros, falhas e problemas, mas também com sucessos ou, pelo menos, resultados iniciais promissores.

Exemplos são muitos. Um dos mais bem sucedidos e conhecidos é o iPad. Atualmente é comum ver alguém manuseando o aparelho de inúmeras funções. O que poucos sabem é que a Apple já pensava no objeto desde os anos 80. Foram mais de 20 tentativas até chegar no produto que temos hoje. Inúmeros motivos – como preço, mau funcionamento ou até mesmo tecnologia insuficiente – impediram que o produto fosse lançado anteriormente. Mas a empresa não desistiu até levar o projeto a cabo.

E se seguíssemos o exemplo da Apple e colocássemos todas nossas ideias no papel e insistíssemos até o projeto tornar-se realidade, quão maior e rápido seria o progresso tecnológico? É difícil prever, porque nem toda ideia daria certo, algumas poderiam causar sérios danos à sociedade. A grande polêmica está aí; não se trata apenas de sonhar e tentar realizar, é preciso analisar calmamente cada ideia. Não é apenas um questão de vontade: existem leis a serem seguidas; É necessário considerar a aceitação do público, a segurança, a viabilidade e uma infinidade de fatores limitantes à concretização da concepção.

Rachel Harding, por exemplo, hipotetizou no vídeo/projeto “Radiance Resort” um spa onde doenças seriam curadas com radiação. Embora não seja ainda realizável, é algo a ser pensado, apesar do tom de crítica irônico por parte de sua idealizadora.

SMIBE- The Radiance Resort from Rachel Harding on Vimeo.

 

O Instituto Faber-Ludens tem inúmeros projetos hipotéticos. Um deles é a “Agência de Consumo”, em que se discute não um produto, mas uma nova forma de ‘comportamento’. Basicamente, idealiza-se uma nova forma de comércio, a que excluiria as agências de publicidade e colocaria as empresas frente a frente com o consumidor. Ainda que seja mais plausível que o “Radiance Resort”,  não é algo facilmente realizável: afinal, estamos falando de hábitos e contratos sociais.

Temos que considerar que, cientificamente falando, estamos em meio a nossa história, ou seja, não podemos imaginar que estamos no fim dos tempos. Avaliemos nosso desenvolvimento tecnológico desde a revolução agrícola. Teoricamente, ainda é possível que tenhamos mais saltos evolutivos desse porte.

Segundo o designer Philippe Starck, precisamos imaginar para quem ‘algo’ será feito, e em que sociedade e época ele estará inserido. Ele afirma, ainda, que somos mutantes e precisamos abrir nosso leque de possibilidades, deixando de lado essa visão fatalista de que somos os últimos homens que existirão. Se não compreendermos isso, perdemos a História. Ele conclui que ainda há muito o que se fazer e, de fato, há.

Philippe Starck

Quando criamos algo precisamos pensar primeiramente em seu aspecto prático, deixando um pouco de lado questões estéticas. Temos que ampliar nosso campo de visão para que nada escape.

O design pode seguir a mesma vereda do cinema, ao conceber produtos inimagináveis, que façam coisas incríveis. Em sua execução, porém, é necessário considerar todos os fatores envolvidos: quando o projeto começar a se concretizar, é preciso avaliar cuidadosamente o que pode dar errado. Afinal, no design não podemos cortar e refilmar.

Referências:

 

Gustavo Henrique

Gustavo Henrique

Paulista do interior, 19 anos, estudante de Design da Universidade Tecnológica Federal do Paraná e gosta do lúdico e bizarro.

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