(re)pensando a fotografia
Um tcheco e um colombiano se questionam, cada um a seu modo, sobre o que é fotografia. O primeiro, já velho de guerra, escreve:
As imagens técnicas são produzidas por aparelhos. Como primeira delas foi inventada a fotografia. O aparelho fotográfico pode servir de modelo para todos os aparelhos característicos da atualidade e do futuro imediato. Analisá-lo é método eficaz para captar o essencial de todos os aparelhos, desde os gigantescos (como os administrativos) até os minúsculos (como os chips), que se instalam por toda parte. Pode-se perfeitamente supor que todos os traços aparelhísticos já estão prefigurados no aparelho fotográfico, aparentemente tão inócuo e “primitivo”.
Pois bem, esse é o Vilém Flusser nos dizendo para pensarmos a fotografia. Não sou eu, é ele. Esse teórico tcheco, erradicado no Brasil e nome recorrente nas discussões sobre design e comunicação. Claro que não é a intenção aqui sintetizar a obra Filosofia da Caixa Preta, um grande marco na maneira de pensar a fotografia. Mas sim apontar como Flusser vê nessa expressão humana a possibilidade de pensar a atualidade e o futuro. Mais do que isso, de perceber como ele usa do seu conceito de imagem técnica para descrever qualquer produção imagética intermediada por um aparelho. Isso inclui a maior parte das nossas produções enquanto designers e, por isso, nos é tão recorrente a leitura desse tcheco simpático. Em especial desse seu estudo daquilo que é a imagem técnica fundante: a fotografia.
O colombiano, por sua vez, tem outra história. Seus primeiros traços são a carvão e ele produz imagens de um realismo e de uma sensibilidade absurda. Mas traços de luz o marcam também e Oscar Muñoz prossegue sua trajetória estética questionando alguns dos temas recorrentes no uso da fotografia. Em fato, boa parte de suas propostas provém da experimentação técnica, como no exemplo abaixo, no qual Oscar imprime através da serigrafia a foto de pessoas se banhando em cortinas de banho. Já na instalação Ambulatorio, Muñoz reinterpreta a visão área da cidade de Cali, permitindo que o caminhar do público altere a imagem final com novas rachaduras no vidro que protegem as fotos.
Por sua vez, muito da obra do colombiano trata da relação da memória e da fugacidade da imagem. Com isso em mente, seus trabalhos demonstram a ação do tempo e da percepção do mesmo, sempre usando de materiais não convencionais, nesses casos com cubos de açúcar que representam pixels e também a água, tanto como material para pintura quanto como suporte para a tinta.
Legenda: Narciso, 2001-2002
Legenda: Re/trato, 2003
Legenda: Línea del destino, 2006
Mais uma vez lidando com o mito de Narciso, Muñoz usa de suas próprias fotos para criar um jogo de imagens daquilo que pode vir a representar a si mesmo. Já no vídeo instalação no qual o colombiano apresenta fotografias que se dissolvem na água e, cujo pigmento, é sugado por um único ralo, é possível ver nele uma alusão a um olho que vê e se apropria permanentemente das imagens.
Ao fim, o tcheco e o colombiano não se encontram numa mesa de bar e trocam gracejos como que pra finalizar a piada. A relação de ambos sequer é direta. O primeiro nos aponta pra dentro da fotografia, nos instigando a estuda-la e analisa-la, o segundo pra fora dela, questionando sua linguagem e uso no cotidiano. Mas ambos trabalham conceitos e questões tão intimamente ligadas ao que concebemos como imagem e de maneira tão irreverente e distinta de seus contemporâneos, que, ao menos à visão desse colunista, eles se assemelham.
Referências:
- http://www.banrepcultural.org/oscar-munoz/index.html
- http://www.artolove.com/oscar-munoz-photographies/
- http://mor-charpentier.com/artist/oscar-munoz/
- http://archiv.ok-centrum.at/english/presse/munoz_huang_tao_fotos.html
- http://cielvariablearchives.org/en/component/content/article/113-traces-disparitions-oeuvre-oscar-munoz.html
- http://www.jeudepaume.org/pdf/PetitJournal_OscarMunoz.pdf
- FLUSSER, Vilém. Filosofia da Caixa Preta. São Paulo: Editora Hucitec, 1985.
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